domingo, 29 de janeiro de 2012

"O Corvo", de Edgar Allan Poe, completa 167 anos

Em 29 de janeiro de 1845 um dos poemas mais conhecidos da língua inglesa era publicado na New York Evening Mirror: The Raven, de Edgar Allan Poe. 

Com clara musicalidade e alusões ao sobrenatural, este poema narrativo tem feito parte do imaginário cultural - especialmente o norte-americano -, sendo adaptado para filmes, parodiado e citado em HQs e na literatura. 

Entre os legados do nosso poeta português Fernando Pessoa, há uma belíssima tradução de The Raven. Reproduzo abaixo as primeiras estrofes. Para quem quiser lê-lo inteiro, logo após as imagens seguem os links para o original e a tradução.

O CORVO

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de algúem que batia levemente a meus umbrais.
Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.

É só isto, e nada mais."

Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais -
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,

Mas sem nome aqui jamais!

Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
"É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.

É só isto, e nada mais".

[Fonte: http://www.insite.com.br/art/pessoa/coligidas/trad/921.php]


Ilustração de Gustave Doré para o trecho "Not the least obeisance made he..."/
"Não fez nenhum cumprimento...". (1884)
[Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/The_Raven]


Ilustração de Gustave Doré para os versos finais do poema. (s/d.)
[Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/The_Raven]


Para ler o original na íntegra, acesse:

Para ler a tradução na íntegra, acesse: 

O BBB e sua estrutura dramática

Por engano, a postagem "O BBB e sua estrutura dramática" foi apagada. Vou retomá-la de forma um pouco reduzida, mas com o essencial do conteúdo. 

A postagem trata de similaridades entre o que conhecemos como estrutura dramática, isto é, a estrutura de ação, de organização das partes a fim de gerar um todo orgânico. Uso o termo emprestado das teorias teatrais adaptado ao propósito de divagar sobre esse polêmico programa de tevê. 

O BBB sempre começa em uma terça-feira e, via de regra, cumpre ciclos semanais. Na quarta há uma festa, na quinta acontece a prova do líder, na sexta ou no sábado tem-se a prova do anjo, no sábado à noite (sempre depois da prova do anjo) há outra festa, no domingo é formado o paredão, na segunda os "brothers" ficam por conta de aguardar a decisão do público, que virá na terça, completando o ciclo semanal. 

Pois bem, a estrutura dramática é aquela em que a tensão é criada de forma crescente e cuja construção visa ao clímax (momento máximo de tensão) e à resolução (desenlace, desfecho) da narrativa. A cada terça-feira, com um novo eliminado, inicia-se outro ciclo dramático. Assim, a festa da quarta funciona como um alívio dramático, após o momento tenso do dia anterior (em filmes, por exemplo, isso é facilmente verificável: após cenas de alta tensão, segue-se uma calma, amena). Na quinta, a ação é retomada com a prova do líder, que dá a um dos brothers o poder de escolher alguém para ir ao paredão. A tensão é gerada porque quem acompanha o programa sabe das preferências e especialmente dos desafetos de cada brother. Na sexta (ou no sábado) a prova do anjo aumenta essa tensão, porque o vencedor pode imunizar justamente quem o líder escolheu. Com esse quadro, a festa do sábado vem novamente amenizar as tensões, pois no domingo é o dia do clímax: a formação do paredão. Para garantir a tensão, a ordem no domingo é sempre a mesma: o anjo imuniza alguém, o líder indica qualquer brother não imunizado e depois todos votam para chegar ao segundo emparedado. Na terça, para fechar o ciclo, a resolução: Bial, que é uma espécie de coro eletrônico, conecta-se com a casa para informar ao grupo a decisão da pólis (o público votante). 

Há uma espécie de deus ex machina (elemento dramático que permite a intromissão divina na narrativa) no programa, o Big Fone. Trata-se de uma clara interferência da produção que, ao ligar para um telefone especial que há na casa (nesta edição é um orelhão). A mensagem telefônica pode se referir a várias coisas, todas elas com o objetivo de gerar aumento de tensão: quem atende pode ser escolhido para o paredão, pode imunizar alguém, pode ser obrigado a indicar alguém ao paredão e por aí vai. 

Nesta edição houve um caso em particular digno de nota: a eliminação de Daniel, no dia 16 de janeiro, um dia antes da data marcada para a primeira eliminação. O motivo foi um suposto abuso sexual praticado por ele contra uma das brothers. O caso está sendo investigado, os envolvidos já tiveram que depor, mas o fato é que as imagens chocaram o público e a comoção foi tanta que a própria produção do programa (olha o deus ex machina aí de novo) não quis pagar para ver: eliminou-o. 

Nota final: a estrutura dramática garante tensão, mas não dispensa a qualidade da narrativa.Quem viu de perto ou mesmo acompanhou de longe as edições em que os vencedores foram Jean Wyllys e Diego Alemão sabe bem o que é isso. Em ambas, esses dois tiveram que enfrentar brothers vilanescos capazes de armações variadas para eliminá-los do programa. No caso do BBB de Jean, por exemplo, havia uma alta dose de discriminação pelo fato de o brother (que seria o vencedor) ser homossexual. Isso é o que faz o BBB ter pouco de reality show (no sentido estrito) e muito mais de folhetim eletrônico: é uma novelinha diária em que os personagens-brothers conduzem suas ações a partir de um roteiro (no mínimo indicativo) cujo interesse maior é garantir a tensão entre os "heróis", como Bial gosta de chamá-los, embora seus feitos não se assemelhem sequer milesimamente ao de um Édipo orgulhoso, uma Antígona justiceira ou uma Medeia enfurecida... Tensão crescente e narrativa polêmica representam, juntas, sinônimo de muitos pontos no Ibope. Goste-se ou não do programa, o BBB é prova disso há doze anos. 


quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

São Paulo: 458


Para a primeira postagem do Sorriso de Medeia, escolhi como tema a cidade onde nasci e na qual mais vivi até hoje, minha amada, idolatrada, salve, salve, São Paulo!  

Não se trata de seleção de hit parade ou  qualquer coisa que o valha. Quero apenas registrar um pouco da minha memória músico-sentimental da metrópole (adorei a aliteração!).  É claro que para qualquer paulistano que se preze a primeira canção sobre a cidade que se aprende  é Trem das Onze (Não posso ficar nem mais um minuto com você...), de Adoniran Barbosa. Também do mesmo autor são Tiro ao Álvaro (De tanto levar frechada do teu olhar...) e Samba  do Arnesto (O Arnesto nos convidou pra um samba, ele mora no Brás...)que acompanham qualquer roda de boa música. Porém, a canção pela qual tenho mais carinho é Lampião de Gás, de Zica Bergami, imortalizada na voz de Inezita Barroso. Aprendi a gostar dessa canção com minha avó Laura, que se emocionava toda vez que a ouvia. A canção é pura nostalgia de um tempo que minha avó havia vivido, recém-chegada do interior do estado. Foi por meio de Lampião de Gás que comecei a entender o amor que São Paulo gera nos corações e a lembrança que deixa nas mentes de quem nela vive.

Zica Bergami é autora de uma das mais belas canções brasileiras, a nostálgica 'Lampião de Gás' - Nilton Fukuda/AE
Zica Bergami (1913-2011), autora de Lampião de Gás

Inezita Barroso canta Lampião de Gás no programa Viola, Minha Viola, 
exibido pela TV Cultura em 7 de agosto de 2011.


Também marcante é Ronda, de Paulo Vanzolini, cantada por vários artistas de renome, inclusive a minha adorada Maria Bethânia. As primeiras vezes que ouvi Ronda, no entanto, foram pela belíssima voz de Márcia (o disco dela é de 1977). Vale registrar que Inezita Barroso já havia gravado a canção mais de duas décadas antes de Márcia (1953). Ronda sempre me fez pensar na melancolia dos que vagam pela cidade à procura de seu amor ou mesmo de um amor qualquer, efêmero ou duradouro, sem nem pensar na consequência (remota, é verdade...) anunciada na canção: "cena de sangue num bar da avenida São João". É deliciosamente deprê, dá para sentir a exaustão do eu lírico naquela procura incessante, pedindo para o superego que o faça desistir da inútil busca só pelo prazer de afirmar que continuará. 


Capa do disco Ronda, da cantora Marcia

Por fim, não poderia deixar de fora Sampa, de Caetano Veloso. É um hino à cidade, que emociona a cada regravação. Lembro-me de uma história engraçada envolvendo essa canção. Anos atrás, o SPTV fez uma série de reportagens sobre o aniversário da cidade, e o mote de uma das matérias era perguntar às pessoas na rua o que elas entendiam de versos da canção de Caetano. Um dos versos era "É que Narciso acha feio o que não é espelho". Algumas pessoas admitiram que não sabiam quem era o "tal" Narciso, outras tentaram interpretar, mas a mais engraçada foi a de uma senhora que virou para o repórter (ou a repórter, não me lembro) e devolveu a seguinte pergunta: "Que Narciso? O Narciso Meira?". Desnecessário dizer que a imagem, ao voltar para o estúdio, flagrou os dois apresentadores da bancada quase chorando de tanto rir. 

Os dois primeiros versos da segunda estrofe de Sampa dizem "Ainda não havia para mim Rita Lee / A tua mais completa tradução". E é verdade, Rita Lee está para São Paulo como Frank Sinatra para Nova York ou Edith Piaf para Paris. O repertório dela é paulistaníssimo mesmo quando não se refere diretamente à cidade. 

A canção conquista as novas gerações. 
Caetano Veloso cantando Sampa com Sandy. 

Para encerrar, não resisto em ser óbvio: FELIZ ANIVERSÁRIO, SÃO PAULO!!! E acrescento uns versos "emprestados" do Roupa Nova, para não deixar dúvidas do que sinto por você: 

Eu te amo e vou gritar
Pra todo mundo ouvir
Ter você é meu 
Desejo de viver
Sou menino e teu amor
É que me faz crescer
E me entrego, corpo e alma
Pra você...